A espera do frango abatido
Mais um da série das coisas que
só acontecem comigo
Ir a feira ou ao mercado é uma
das atividades mais comuns em cidades de pequeno e médio porte, já nas grandes
com o advento dos deliverys, poucos se aventuram em coisas tão bucólicas e/ou
prosaicas quanto o fato de sair a caça de seu próprio alimento, mas muitos de
nós sabemos que desde tempos imemoriais ou das cavernas foi dado ao homem a
descoberta da necessidade dele precisar buscar informações de como chegar até a
esse alimento; viu, ou melhor ouviu pessoal do telemarketing, por que ler no
trabalho é praticamente impossível.
Peço desculpas por esta pequena
introdução, e talvez você fique se perguntando o que o frango abatido tem a ver com telemarketing
e com minhas andanças literárias, então vamos ao fato: Caminhar nos últimos
tempos tem sido uma rotineira e prazerosa tarefa, pois observar o mundo que me
cerca é uma das minhas atividades mais divertidas e sobre-humanas e ontem
quando minha irmã me solicitou que fosse comprar um frango abatido na hora pra
que ela o fizesse ao molho pardo, claro que obteve meu pronto atendimento e me
prontifiquei de levantar muito cedo e aproveitaria para retomar minha atividade
física , perguntei-lhe então a que horas o abatedouro abriria, ela me informou
que depois das sete...quando acordei, depois da higiene natural , coloquei o
tênis e lá fui eu atrás do estabelecimento de seu Hélio, o dono do tal
abatedouro, no meu percurso até lá , passei pelo morro do bumba, (alguém lembra
da tragédia?), e segui o meu caminho, observando as pessoas que atravessavam o
meu caminho, na grande maioria mulheres , atracadas literalmente a suas pequenas
bolsas de valores particular por medo obvio que algum larápio, seguro de sua
atividade e protegido pela justiça brasileira, surripiasse o suor de seu
trabalho, esse sim sem proteção alguma, homens engravatados dirigindo os seus
possantes pela estrada do viçoso jardim e outros tantos em pé de chinelos , de
bermudas e camisas nos ombros, mas uma coisa me chamou particularmente a atenção:
a quantidade de meninos vestidos de uniformes de futebol, alguns acompanhados
de suas mães, outros sozinhos, embora sei que existam,infelizmente não observei
nenhum pai entre eles , e outra coisa curiosa, é que o uniforme que era de um projeto
esportivo, tinha escrito o nome , pasmem: TIO SAM!, gentem, mais Barac, impossível!
Só se for nas Casas Bahia! Aquilo me chamou atenção de tal forma que não
resisti e puxei conversa com uma dessas mães que aguardava o transporte público
com o pequeno agarrado a sua mão, e ela então me conta que a esperança dela era
o filho ser descoberto por um olheiro e que fosse jogar em time grande e que
ganhasse muito dinheiro, então olhei pro garoto e perguntei se ele tinha um sonho, ela nem deixou o garoto abrir a boca e respondeu
que o sonho dele era ser famoso, comprar um iate, namorar uma atriz famosa da
tv, ser empresário de grupo de pagode e comprar uma casinha pra mãe dele, “-Num
é filho?”, o ônibus chega e eu fico na porta do abatedouro do seu Hélio, que
abriria depois depois das 7, lembram? E já eram 8h e 15min...e eu de repente me
pego pensado naquele menino, naquela mãe e naqueles 7X1, ali na frente do abatedouro de frango, e apesar de ser
um admirador de futebol, de ser torcedor apaixonado pelo meu River, em Teresina
e pelo glorioso Botafogo aqui no Rio, fico matutando se as falcatruas que
envolvem o mundo do futebol teriam alguma coisa a ver com isso, ou melhor, pior, caso queiram, com
aquilo e vejo que a corrupção é uma coisa comum no Brasil, e agora tenta chegar em outros esportes, vejam o
caso CBV, atravessando uma grave crise ética, porem os jogadores de voley, com
mais anos em bancos de escola e com mais brio entre suas pernas não baixaram suas
cabeças diante dos cartolas e batem de frente pela história e pela honra....puxa
vida 7x1, e já quase 9hs, quando de repente surge seu Hélio, de jaleco branco, era
o dono do abatedouro e eu já quase abatido pela espera percebo nele um personagem
misto de Fellini, Almodovar e Tarantino e ao levantar suas portas, passa a pedir
desculpas pela minha espera , o horário de verão deixava-o confuso e tudo om um
sorriso que tirou de mim qualquer suposição ou raiva, contou-me rapidamente ,no
tempo dele , sua pequena longa história de vida, um homem simples, de uma vida
simples, e me contava aquilo enquanto cortava o frango pela cabeça, tirava-lhes
as vísceras e, depenava-o..foi me contando que tinha agora poucos clientes e
que fazia questão dele mesmo atender e
sabia o nome de cada um deles. Quando terminou, fiz-lhe o pagamento em dinheiro
vivo, como dizem, mas pra mim era apenas mais um pedaço de árvore morta, com o
qual pagava por um animal que estava vivo e foi morto para alimentar seu
superior na cadeia alimentar, eu, justamente eu que me sentia abatido pelo meu
pensamento sobre os sete a um. Sobrevive melhor quem se finge de morto!
Depois que saí do abatedouro, com
o frango abatido dentro do saco, volto pra casa cansado e penso nos atendentes
de telemarketing, pois antes de encontrar pessoalmente com o dono , fui
informado por quatro pessoas dos horários que Seu Hélio abriria seu
estabelecimento, e os horários foram depois das 7h, as 8hs, as 8h30m e as 9h respectivamente
e pela falha de comunicação descobri que o tempo de seu Hélio é outro, então
que se respeite o tempo de seu Hélio....e o tempo dele não é o de verão! Então isso
tudo me deu sede, que tal um copo dágua......água?
Bom, ai isso já é outra história!
Mocha
Niterói 27 de janeiro de 2015